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Dr. Iago é (um mega) neurologista, com formação no Hospital das Clínicas da USP, e especialização em neurovascular. Além disso, ele é intensivista, diarista da UTI do Instituto do Câncer do HCFMUSP (ICESP) e professor do curso Emergências Neurológicas da SIMM. Se fosse pra colocar tudo que esse cara faz, não ia caber na descrição. O cara é foda!
No episódio de hoje ele te mostra como atende um déficit neurológico agudo – da chegada até a alta. Confira os highlights abaixo!
Dicas da história
– Perguntar última vez que o paciente foi visto bem. Às vezes pode ser útil procurar “testemunhas”.
– Tente ver se o déficit faz “sentido anatômico” – ex: Paresia à direita e dificuldade de fala são compatíveis com AVC à esquerda (área de fala e de movimentação à direita). Paresia bilateral, por exemplo, não faz sentido anatômico.
– Tente juntar os dados em síndromes – ex: Síndrome de fala, síndrome motora, síndrome sensitiva, etc.
– Déficits vasculares são súbitos! Mas cuidado com essa informação, ela pode ser enganosa (não exclua ou confirme a etiologia vascular unicamente pode essa informação).
Avaliação inicial
– Monitorizar – Procurar as 3 grandes síndromes de emergência que matam – insuficiência respiratória, choque e rebaixamento.
– Pacientes podem ter alterações neurológicas por hipotensão grave, por exemplo
– Glicemia capilar JÁ. Tanto hipo como hiperglicemia podem causar déficit neurológico
O que avaliar na TC?
– Passo 0 – Excluir sangramento
– ASPECTS – Sinais precoces de isquemia
– AngioTC – Há obstrução de algum vaso proximal? Por exemplo, há oclusão de carótida ou ramos proximais (como M1 da cerebral média).
O que fazer com o paciente com AIT?
– Via de regra, o paciente deve ficar INTERNADO
– É preciso investigar o mecanismo do AIT, pois ele pode recorrer nos próximos dias
Quais são os mecanismos possíveis?
– Cardioembólico – Fibrilação atrial, fração de ejeção muito baixa (em geral < 30%), trombo em VE, diagnóstico de endocardite (que pode embolizar)
– Aterotrombótico – Grandes vasos (carótida > 50%). Pode ser tanto por instabilização da placa com formação de trombo/embolização como uma placa com estenose grave que causa isquemia em situações de redução do fluxo (ex: hipotensão). Pacientes com oclusão de carótida podem recrutar colaterais e reverter o déficit, mantendo lesão grave em grandes vasos.
– Lacunares – Degeneração hialinoide de vasos muito pequenos, principalmente em hipertensos. Ocorre mais em região nucleotalamocapsular, ponte e cerebelo. Imagem muito pequena, vista principalmente na ressonância, nesses locais específicos.
– Outras causas – Dissecção de carótida ou vertebral, endocardite, web carotídea, trombofilia. Pensar muito em outras causas em jovens (< 45 anos).
– Indeterminado – Não achou nada!
Como investigar mecanismo
Básica – Investigar ritmo (ECG e holter), procurar disfunção ventricular e fontes de embolia no coração (ecocardiograma), investigar vasos (angiotomografia de vasos intra e extracranianos/cervical)
Prescrição do paciente com AIT
– Paciente com AIT não cardioembólico deve receber dupla antiagregação plaquetária (DAPT) – AAS e clopidogrel – por 21 dias (estudo CHANCE).
– Se não tiver déficits, pode liberar dieta
– Estatina de alta potência (atorvastatina 40-80mg ou rosuvastatina 20-40mg)
– Reconciliar antihipertensivos apenas após ~48 horas (pode deixar mais hipertenso nos primeiros dias)
Como trombolisar
– Controlar PA se > 185/110 (nitroprussiato é a escolha – controle rápido e mais fácil o ajuste)
– Alteplase 0,9mg/kg (máximo de 90mg). 10% em bolus ao longo de 1 minuto. O restante, 90%, faz em 1 hora.
– Manter PA < 180/105 durante a trombólise
– Monitorização – PA de 15 em 15 minutos. NIH de 15 em 15 minutos nas primeiras duas horas.
– Interromper trombólise se rebaixamento, piora do NIH, sangramento importante, instabilização hemodinâmica, angioedema grave
– Não prescrever AAS e enoxaparina nesse momento
– Evitar procedimentos invasivos nas primeiras 24 horas
Cuidados após a trombólise
– Internar em UTI! O paciente pode sangrar pela coagulopatia associada ao trombolítico (degradação tanto de fibrina como de fibrinogênio!)
– TC de controle em 24 horas é essencial! Isso serve para ver se não houve sangramento. Se não houve sangramento, pode-se iniciar AAS 100mg e heparina profilática.
Como prescrever o paciente com AVC isquêmico
– Não liberar a dieta inicialmente. Realizar triagem de disfagia! Se fono disponível, é o melhor dos mundos. Se não houver, tentar o teste do copo d’água (200ml de água e vê se o paciente tem engasgo, tosse, voz molhada – se o paciente não tiver nenhum destes, ele passou no teste). Se o paciente passar no teste do copo d’água, liberar a dieta mais segura disponível (ex: Pastosa com líquidos espessados). Na dúvida, deixar em jejum inicialmente.
– AAS 100mg após a TC de controle sem sangramento
– Profilaxia de TEV – Compressor pneumático intermitente para todos. Meia elástica não serve, não ajuda e aumenta lesões de pele. Heparina pode ser prescrita se não houver sangramento na TC de controle em 24 horas. Se houver sangramento pequeno, precisa de avaliação do neuro.
– Antihipertensivos podem ser reconciliados com calma após 48 horas.